sexta-feira, 25 de abril de 2014

Neste mesmo dia, há quarenta anos atrás

Nesta data costuma perguntar-se:
- Aonde estavas no 25 de Abril?
Pois bem, há quarenta anos atrás tinha 10 anitos, e como acontecia com a grande maioria das crianças de então tinha escola de manhã e de tarde.
Naquela manhã, e tal como sucedia todos os dias, a minha mãe acordou-me, e enquanto eu me arranjava, ela preparava-me o pequeno – almoço.
Normalmente, a minha amiga e colega da 4ª classe Aura Sá vinha ter comigo, e seguíamos as duas para a escola.
Aquele dia não foi excepção, e pelas 8h e 40m a Aura tocou à campainha.
A partir desse momento os acontecimentos desenrolaram-se em catadupa, qual montanha russa…
A minha mãe abriu a porta e deparou-se com uma Aura perfeitamente alvoraçada que repetia incessantemente:
- D. Benilde há guerra em Lisboa!
-O que dizes Aurita? Ainda vens a dormir ou quê? (convenhamos que a Aura era uma menina deveras distraída…)
- É verdade D. Benilde, ligue o rádio! A minha mãe diz que é lá em Lisboa, é muito longe, e que temos de ir na mesma para a escola! Ligue o rádio!
Perante tal alarido, fez-se-lhe a vontade, e o dito “cantou” não os habituais fados, mas uma “cantilena” para mim sem sentido, em que alguém pedia para as pessoas permanecerem em suas casas.  
Ficámos meio atónitas, até que a minha mãe “desceu à Terra, e ditou a “sentença”:
- A tua mãe tem razão, aquilo é lá em Lisboa e vocês têm escola aqui, portanto é para lá que vão!
E fomos, mas contrariamente ao habitual, a nossa Professora, a D. Isaltina dos Anjos Cardoso, não havia ainda chegado. O facto era extremamente inusitado, pois a pontualidade era para ela coisa sagrada.
A rapaziada estava feliz da vida, já que, nenhuma das Professoras da 1ª  à 4ª classes se encontravam presentes.
O atraso fora de comum durou cerca de 45 minutos, e quando já nos perguntávamos se não deveríamos regressar às respectivas casas, eis que surgem todas as professoras em conjunto.
Hoje percebo que deviam estar reunidas, tentando decidir o que fazer; dar aulas normalmente, ou mandarem-nos embora. E foi justamente o que sucedeu, enviaram-nos para casa, decisão que me deixou perplexa. Com os meus 10 anitos, raciocinei que algo de muito extraordinário estaria a acontecer, que se sobrepunha às pessoas que, em meu entender, tinham mais autoridade.
Dali em diante, nada seria como dantes, e em breve eu estaria a desejar voltar a ouvir fados na rádio, (estilo musical que não apreciava) e já não conseguia suportar o tão badalado tema da “Gaivota”.
Naquele mesmo ano fiz o exame da 4ª Classe, e entrei para o então 1º ano do Ciclo Preparatório, aonde tive novos colegas, novos professores, e vivi todo o clima do PREC.
Mas essa é outra história.




Deixo-vos com uma foto da época, julgo que de 1975, tirada no terraço da casa da minha amiga Aura, em que estou eu (cabelo comprido e blusa às riscas), meus pais, a minha amiga de óculos , e a irmã dela quase bébé.

2 comentários:

  1. Para nós as crianças daquela época, o 25 de Abril começou por ser uma manhã em que não pudemos ir à escola. Claro, aqui em Lisboa soube-se logo às 8 da manhã, que a coisa estava preta e que ninguém podia sair de casa. Nós fomos para a varanda ver não sei o quê, porque em Benfica não havia tanques. O Rádio falava no movimento das Forças Armadas e os meus pais, que eram contra o regime estavam todos contentes. No entanto temia-se uma guerra civil. Pensavam-se em tiros, sangue derramado pelas ruas.

    Na varanda, vimos uma das colegas de Liceu da minha irmã, que já andava no Sétimo ano. Avisamo-la para não ir para o Liceu, que era perigoso. A rapariga, que já andava metida nos movimentos contra o regime, talvez o MRPP, ficou toda contente e disse que por nada deste mundo ia perder um momento daqueles e partiu toda contente para o Liceu juntar-se aos outros cabeludos.

    Enfim pequenas recordações, despertadas pelas suas

    Bjos

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    1. Pois é Luís, não há dúvida de que, inicialmente, o 25 de Abril foi para nós, miúdos, uma folga da escola, mas quando cheguei a casa só queria saber do meu pai, o qual trabalhava em Lisboa, aonde era Chefe de Recursos Humanos, (na época chamava-se Chefe de Pessoal) e que naquele dia havia saído em serviço da empresa justamente para a Baixa. Foi uma tensão daquelas, já que na empresa a Administração mandou todos os funcionários para casa...e do meu pai nada...
      No meu caso pessoal, vivi os tempos que se seguiram, como se de uma “prisão” se tratasse. A minha ditadura começou no momento em que os outros davam asas à liberdade…
      Era o tempo das “mais amplas liberdades…”e de toda aquela linguagem estereotipada.
      Talvez este venha a ser o tema de mais um post para assinalar o 1º de Maio.
      Esqueci-me de frisar que, se fosse actualmente, as professoras não teriam encontrado um único aluno a quem mandar para casa, e que nessa diferença de atitude está bem patente que a autoridade da classe docente é uma sombra do que era então.
      Mas voltando às suas memórias:
      - Desatei a rir-me sozinha só de imaginá-lo a si, e aos seus irmãos, na varanda, da gargalo no ar, perscrutando coisa nenhuma.
      Quanto à mocinha revolucionária, tenho para mim que hoje deve ser PSD…bem ao estilo Tia de Cascais...afinal de contas há-os por aí aos molhos, a começar pelo Durão Barroso…


      Enfim,esta temática dá pano para mangas!

      Beijinho

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